Meu Marechal
Não abdicando de
me manter em sentido, peço que me permita o à vontade de me dirigir a si.
Pensei se seria adequado fazê-lo, até porque existe algum precedente de
conversas mal sucedidas com pessoas do passado, com pessoas que, enfim, já não
estão vivas… Acontece que acho controversa a afirmação que o Nosso Marechal não
esteja vivo.
É Natal, fim do
ano de 2013, em que o nosso Colégio foi colocado sob uma grave ameaça. Muitos
gostariam de saber o que pensa do tema das meninas, se são elas a ameaça….
Pessoalmente estou certo que considerará incontroverso que as meninas são
bastante diferentes dos rapazes, em especial na adolescência. Estou certo que
concordará que a ameaça não tem origem nessas meninas nem nos seus pais. A
ameaça vem, como sempre, da mistura venenosa da ignorância com o egoísmo, os
dois velhos inimigos da nossa cultura de disciplina e solidariedade.
Quando reflicto
no percurso dos meus filhos, ou no meu próprio percurso e dos meus camaradas, imagino
a sua satisfação quando começou a observar os resultados extraordinários da
educação de rapazes em ambiente militar. Um sistema baseado na força do grupo ,
o grupo que é um motivo constante e bastante dos jovens rapazes, um grupo
forte, com regras claras, controlando e orientando a agressividade para
objectivos de formação. Imagino o orgulho que teve quando começou a ver os
resultados práticos do sistema que adoptou. Um sistema simples e robusto
completamente ajustado ao processo de desenvolvimento dos rapazes. Daqui de
onde estamos, podemos já ver 210 anos de resultados.
O Nosso Marechal
foi ministro num período de grande crise, vindo da Cumeeira de longe de tudo, por
isso conhece intimamente a prática e as questões do poder. Concordará que o que
está em causa não são as meninas. Essas crianças são apenas um meio, são a ferramenta
utilizada para provocar uma mudança rápida, radical, muito visível e capaz de
provocar danos irreversíveis. O que está verdadeiramente em causa é se podem ou
não os militares ensinar segundo um modelo próprio e diferente. Se a educação
militar for igual a todas as outras então os militares em nada são diferentes.
Se em nada são diferentes é porque os militares não existem para além das suas
operações, as quais por mais eficazes que sejam terão sempre muito menos
utilidade que o seu contributo para a coesão do país. Quem não acredita em
Portugal como Estado Soberano nunca verá qualquer utilidade nas Forças Armadas
como instituição, muito menos nas suas emanações simbólicas. Que acontecerá se
mesmo os militares não entenderem e cultivarem a sua função, abdicando de se
considerarem, verdadeiramente, parte de uma instituição ?
Temos então o
Colégio e o seu valor simbólico. Como disse o Eduardo Lourenço (92/1934) o
Nosso Marechal formou um "mini-exército
sobre qual o verdadeiro exército se desenvolveu , colocando-se radicalmente ao
serviço de Portugal". Essa profundidade histórica e a coesão essencial
do universo dos Antigos Alunos ocupa espaço e incomoda alguns. Perversamente,
esta dimensão simbólica está a ser utilizada para fazer uma exibição de poder,
desrespeitando a história e a natureza militar da instituição. Para este poder
o Colégio é completamente indiferente,
desde que lá se passe exactamente aquilo que lhe é ordenado e que aceite beber
o veneno que o fará morrer aos poucos, sem o incómodo de uma morte violenta.
Meu Marechal, esta
é a maior ameaça que o seu legado desde sempre enfrentou. Com os franceses Portugal
estava também assim fraco e a morrer. Mas o Rei estava no Brasil. Além disso, quando vieram os franceses estava
o Colégio a nascer, como disse o 92, para se colocar radicalmente ao serviço de
Portugal. Não podemos agora ser menos radicais, no sentido de mantermos as
nossas raízes patrióticas, defendendo-as de quem as quer cortar. Nada de
essencial mudou desde essa altura e continuamos a precisar da alma que superou
todas as crises, todos os franceses, todas as guerras, mesmo as mais
lancinantes e fratricidas. Sem alma morrerá o Colégio, mas Portugal terá
morrido antes.
É Natal no mundo Meu Marechal, tempo de
renascer. Nós Portugueses teremos de opor ao fratricídio que nos assombra, a
fraternidade que é a essência da sua obra. É também tempo da família e por isso
vou dar a ler esta carta aos meus irmãos. Estou certo que aprovará.
Carlos Rio
Carvalho (307/71)
Natal de 2013